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O Brasil é um dos maiores produtores de cana-de-açúcar do mundo. Isso é há muito sabido. O que pouco se diz, no entanto, é da influência do Centro de Cana do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) neste cenário de alta produtividade do setor sucroenergético brasileiro.

Referência na área de pesquisas canavieiras, o Centro é parte do Programa Cana IAC e realiza um trabalho multidisciplinar envolvendo melhoramento genético da cana, ciências do solo, caracterização de ambientes de produção, fitotecnia, manejo de pragas e estimativa de produção, entre outras tarefas que impactam diretamente na produção nacional de cana-de-açúcar.

Desde 2005, o Programa Cana IAC tem nome e sobrenome: Marcos Guimarães de Andrade Landell, engenheiro agrônomo que há 40 anos atua como pesquisador do IAC. Ele conta que o desejo de trabalhar com pesquisa em agronomia surgiu ainda na infância, quando passava de bonde com o avô em frente ao Instituto Agronômico de Campinas. “Meu avô costumava visitar o IAC e me levava com ele. Ele conversava com os pesquisadores para saber das novidades e voltava com mudas de plantas para o sítio da família, em Casa Branca.”, diz.

Ele se lembra ainda que, nesta propriedade rural, havia uma plantação de café e o avô colocava os netos, entre eles Landell, para ajudá-lo no trabalho de espalhar e recolher os grãos no terreiro do sítio, em época de colheita. “São memórias que estão na raíz da minha formação. Esse ambiente despertou em mim o interesse pela função que desempenho hoje.”, afirma ele, com a consciência de que a aposta em realizar um sonho de infância desenvolveu ferramentas que mudaram para a melhor as condições da agroindústria canavieira.

Assim que foi admitido como pesquisador do IAC, por meio de concurso em 1981, Landell passou a trabalhar na Seção de Cana-de-Açúcar. Era um tempo em que o departamento estava em processo de esvaziamento, sem reposição suficiente de servidores e com várias pesquisas interrompidas pelo meio. Almejando contribuir da melhor forma, mesmo diante das dificuldades acarretadas pela falta de recursos humanos, o pesquisador conseguiu autorização para fazer o doutorado em Produção Vegetal, com especialização em Melhoramento Genético de Cana-de-açúcar, em Jaboticabal. Ao retornar ao seu posto de trabalho, pediu transferência para a unidade do IAC em Ribeirão Preto, onde a realidade da região, grande produtora de cana, era mais propícia para colocar em prática seus estudos.

Dez anos depois de seu ingresso no instituto, em 1991, Landell passou a se reunir semanalmente com amigos profissionais do setor. As reuniões, feitas a princípio num bar de Ribeirão, tinham como objetivo discutir técnicas sobre espaçamento, variedades, plantio, doenças e outros temas relacionados à cultura da cana-de-açúcar. “Criei esse grupo para me especializar ainda mais e aprender com quem dominava cada aspecto do cultivo de cana. Voltava pra casa com os bolsos cheios de anotações. Com esses caras aprendi a adubar, plantar aplicar herbicida…”, relembra.

Segundo o pesquisador, esses encontros resultariam, mais tarde, na criação do Grupo Fitotécnico — e este no Programa Cana IAC, que existe até hoje como resultado da reorganização do instituto, levada a cabo em meados da década de 1990. Com a contratação de novos pesquisadores e um novo modelo de gestão do departamento de cana, sob o comando de Marcos Landell, as pesquisas voltadas para o setor canavieiro deram um salto de qualidade.

Nessa mesma época, Landell teve a oportunidade de renunciar ao cargo público e assumir uma função no setor privado, por um salário tentador, mas optou por continuar no IAC. “Meu ideal de vida sempre foi fazer a diferença com as minhas pesquisas. E num instituto de pesquisa do estado a gente tem o tempo e a liberdade necessários para contribuir com a sociedade e deixar um legado.”, diz. Um dos legados que serão deixados pelo pesquisador é a cana-gigante.

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Fruto de uma variedade de alto desempenho desenvolvida pelo Instituto Agronômico de Campinas, a cana-gigante pode atingir até seis metros de altura. Isso não seria possível sem o Programa Cana IAC e o trabalho de convencimento de Marcos Landell, que tem dedicado os últimos anos a apresentar esta e outras variedade de cana aos produtores do setor. “É possível produzir mais em quantidade e em qualidade. É disso que estamos falando.”, explica o pesquisador.

Segundo Landell, as variedades desenvolvidas pelo instituto (IACSP91-1099, IACSP93-3046, IACSP94-2094 e IACSP95-5000) contém elevada produtividade e concentração de sacarose e garantem o ganho de produtividade de 1,5% ao ano. Esse número poderia ser ainda maior se os produtores tivessem mais informações sobre a forma correta de cultivo dessas variedades, sobretudo a IAC91-1099 e a IACSP95-5000. Se comparadas com as canas mais cultivadas para fins comerciais no País, a produtividade delas foi superior a 17%, no caso da primeira variedade, e de 11%, no caso da segunda. Sob condições ideais de cultivo, a cana-gigante pode apresentar produtividade de 300 toneladas por hectare. Ou mais.

Para quebrar a resistência dos produtores, Marcos Landell não apenas tem viajado o Brasil nos últimos anos para apresentar aos interessados as vantagens de se adotar as variedades do IAC, como liderou o projeto que originou um sistema inédito — e revolucionário — de plantio da cana: o de mudas pré-brotadas, ou MPB. Trata-se de uma tecnologia que contribui para a produção rápida de mudas com alto padrão de fitossanidade e que aumenta a produtividade na mesma medida em que reduz a quantidade de mudas necessárias por hectares.

Segundo Landell, produtores que adotam o sistema MPB (o plantio direto da planta ao invés do colmo semente) estão colhendo resultados muito promissores. Há casos de empresas que pularam de 70 para 100 toneladas de cana na colheita. “Isso tem um impacto econômico considerável. As usinas já estão percebendo isso e aderindo à tecnologia.”, conta o pesquisador. Ele considera ainda que esta é “uma das maiores tecnologias em décadas a auxiliar a agroindústria.”

Apesar de ser uma das maiores autoridades no setor, Marcos Landell revela a “angústia de não fazer mais do que gostaria” pela agronomia brasileira. No entanto, ele se diz satisfeito por ter contribuído de modo decisivo para a canavicultura. “Sou orgulhoso das tecnologias que ajudei a desenvolver dentro do IAC, mas acho que o mais importante foi ter conseguido passar adiante este conhecimento. Ao sair dos muros do instituto e passar para o campo, a pesquisa na prática se torna parte do dia a dia das pessoas.”, diz.

Hoje o IAC mantém uma rede experimental que abrange 11 Estados brasileiros, com cerca de 160 empresas conveniadas que trabalham com 20 variedades IAC no setor sucroalcooleiro. O Programa Cana IAC tem elevado a competitividade da canavicultura paulista e de países estrangeiros na África e na América Central. “Minha história com a pesquisa, até agora, valeu a pena.”, conclui Landell.

Bruno Ribeiro, para a APqC

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