brasil fome

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) divulgou recentemente os dados de insegurança alimentar no mundo. O relatório anual SOFI confirma a tendência para o aumento de subalimentados em razão de crises econômicas, desigualdades sociais, conflitos políticos e de variações climáticas extremas.

Em tempos de pandemia mundial, a insegurança alimentar e nutricional agrava-se com 811 milhões de pessoas padecendo de fome, e 2,3 bilhões (30% da população) sem acesso à água e à alimentação adequada. Acentuam-se as dificuldades dos países para a erradicação da fome e pobreza, dois aspectos centrais dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

No Brasil, o “Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19”, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, assinala que mais da metade dos brasileiros, 116,8 milhões de pessoas, padeciam com a insegurança alimentar em 2020. Desse total, 43,4 milhões não tinham alimentos suficientes e 19 milhões enfrentavam a fome.

O cenário de insegurança alimentar agravou-se com a crise sanitária em decorrência da epidemia do vírus SARS-CoV-2. Até agosto de 2021, as mortes associadas à covid-19 chegaram a mais de 4,2 milhões de pessoas no mundo, 577 mil pessoas no Brasil e 145 mil pessoas no Estado de São Paulo.

Por sua vez, o 6º Relatório Internacional do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas traz evidências científicas de que as alterações no clima global, elevação das temperaturas e alterações nos padrões de precipitações, decorrem de ações humanas. A agricultura é um setor que influencia na emissão de gases de efeito estufa e, também, é fortemente afetada pelas variações climáticas.

A COP-26 sobre mudança climática deverá reforçar o compromisso dos países para práticas de produção de alimentos aderentes ao desenvolvimento social e preservação dos ecossistemas naturais. Apoiar sistemas alimentares capazes de mitigar os impactos climáticos estão entre as diretrizes ao futuro,.

IMPACTOS NA MESA DO CONSUMIDOR – HORTIFRÚTI, CAFÉ E LEITE

No Brasil atual, nota-se o crescimento de queimadas e desmatamentos. Ao mesmo tempo, os fenômenos climáticos atingem a agricultura de forma mais agressiva. As estiagens – diminuição de precipitações e redução da disponibilidade hídrica – e a ocorrência de frio intenso (geadas e nevadas) impactam a produção e oferta de alimentos.

As geadas nos meses de junho, julho e agosto de 2021 causaram novas perdas aos agricultores, que já vinham sentindo os impactos das secas na produtividade das lavouras. Simultaneamente aos fenômenos climáticos, os agricultores se deparam com o aumento nos custos de produção. Em momento político e econômico de alta inflação, cotação elevada do dólar, desemprego e precarização do trabalho, produtores e consumidores sofrem com a escalada dos preços na produção agrícola e no acesso aos alimentos.

O auxílio emergencial de R$600,00, oferecido pelo governo federal em 2020, ajudou muitas famílias. Entretanto, a sua drástica redução, com valores que variam de R$150 a R$375, e a restrição no número de atendidos têm repercutido no consumo alimentar. Em julho deste ano, segundo a FIPE (2021), o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) de Alimentos foi de 1,52%, enquanto em 2020 e 2019 foram de 0,63% e -0,11%, respectivamente. Há expectativas de valor superior em agosto.

Segundo o DIEESE, de janeiro de 2019 até julho de 2021, o poder de compra da cesta básica, em relação ao valor do salário mínimo, caiu fortemente. Para comprar uma cesta básica em março de 2020, o trabalhador brasileiro precisava trabalhar 109 horas e 10 minutos. Em junho de 2021 passou a precisar de 129 horas e 5 minutos, cerca de 18% a mais que o ano anterior.

Desde o início da pandemia, o poder de compra diminuiu, reprimindo o consumo de alimentos. Para agravar o cenário, as geadas dos últimos meses elevaram os preços das frutas, hortaliças, do café e do leite, produtos entre os mais suscetíveis às intempéries.

No Cinturão Verde do Estado de São Paulo, o morango em ambiente não protegido, a produção de folhosas como alface, espinafre e manjericão, e também legumes como cenoura e chuchu, foram algumas das culturas prejudicadas. Estimam-se perdas de 30 a 40% na produção das hortaliças por efeito das geadas. As hortaliças, por serem de ciclo curto, poderão ter maior rapidez na recuperação se houver investimentos.

Os dados do levantamento de preços agropecuários do mês de julho do Instituto de Economia Agrícola indicam que as fortes geadas impactaram frutas e hortaliças com a alta nos preços do tomate para mesa (+67,10%), batata (54,25%) e banana nanica (+43,86%). Da análise das variações de preços nos últimos 12 meses, nota-se que o tomate, base do cardápio alimentar, sofreu reajuste de 82,03%.

As expectativas para a safra cafeeira paulista de 2021/22 indicavam potencial produtivo acima de 6 milhões de sacas de 60 kg de café beneficiado (média das últimas três safras de alta contabilizadas pelo IEA). Mas a estiagem prolongada no período chuvoso, seguida por ondas de massa de ar polar nos principais cinturões cafeeiros paulistas, ocasionou perdas substanciais nas lavouras.

Com a estiagem houve encurtamento no desenvolvimento dos ramos produtivos, o que limita a produção futura. Nas geadas, esses mesmos ramos foram novamente afetados. Nos cinturões produtivos as perdas podem alcançar a totalidade da produção. As estimativas acenam para redução de 10 a 12 milhões de sacas na safra brasileira. A piora também na qualidade da bebida pode ser um efeito secundário adverso.

O levantamento mensal do IEA (Portal Varejo) indicou aumento de 14,0% nos preços do café em pó em 2021, e entre junho e julho já se observou aumento de 5,5%. A indústria de torrefação e moagem estima que até dezembro os preços podem se incrementar em mais de 40%. Os bons preços praticados para os cafeicultores não são suficientes para fazer frente ao aumento dos custos de produção.

Na produção de leite, as intempéries climáticas, como o período de seca, com a entrada na entressafra do produto em maio, já haviam provocado a elevação dos preços em 9,5%, até julho de 2021. Com as geadas, os pastos foram altamente comprometidos, mas o impacto não ocorre de imediato, pois o pagamento aos produtores ocorre apenas 30 dias após a entrega do produto ao laticínio.

O varejo, principalmente as grandes redes de supermercados, trabalha com grandes estoques, especificamente do leite longa vida. O reflexo da alta no varejo acontece normalmente após um período maior. Entretanto, vale ressaltar que o mercado lácteo já está ressentido, e não há espaço para grandes aumentos dos preços para o consumidor neste momento que a indústria já se manifesta preocupada com os rumos do consumo.

Os dados de julho do Índice de Preços dos Supermercados (IPS), da Associação Paulista de Supermercados (APAS), mostram que, em relação ao mesmo período de 2020, houve desaceleração na alta para o consumidor, registrando elevação de 3,3%, diante do avanço de 21,62% do ano anterior.

As perdas por efeito do clima trouxeram prejuízos para o setor produtivo paulista. A recuperação das atividades exigirá maiores investimentos, afetando o custo de produção dos alimentos, já tão comprometido com as variáveis citadas anteriormente.

MEDIDAS EMERGENCIAIS

O consumo diário de frutas, legumes e verduras é um dos requisitos para a saúde e prevenção de doenças. Uma dieta saudável, rica em vitaminas e nutrientes, depende da oferta e do acesso aos produtos pelos consumidores. Daí a urgência na adoção de políticas públicas que ajudem a recompor as perdas por eventos climáticos no campo.

Aportes de créditos emergenciais e subvenção para aquisição de mudas de café e hortaliças, bem como para aquisição de fenos, pré-secados e silagens para a pecuária de leite, estão entre ações necessárias para execução do poder público.

O seguro rural se mostra eficiente para compensar perdas por eventos climáticos e/ou preços. O Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista – o Banco do Agronegócio Familiar (Feap/Banagro), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, disponibiliza quatro modalidades com limite de subvenção de R$15.000,00.

A contratação de seguros tem crescido conforme a disponibilização dos recursos de subvenção pelo FEAP. No momento, foram aportados mais de R$30 milhões para o seguro rural, totalizando R$57 milhões em 2021, importância 11,7% superior aos R$51 milhões em 2020. O FEAP está gerindo, também, um crédito emergencial para produtores rurais afetados pela pandemia, seca e geadas, no total de R$100 milhões.

A parceria entre a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e o Sebrae deverá ofertar, ainda, recursos da ordem de R$50 milhões para agricultores com produção comprometida pelas geadas. Cada produtor poderá ter um crédito de até R$21 mil21.

Se o comércio dos produtos agrícolas enfrenta dificuldades em função do cenário de fragilidade econômica, a tendência é de se agravarem diante dos fenômenos climáticos. Daí a urgência dos governantes executarem políticas públicas compensatórias para que os agricultores consigam em curto prazo reverter a situação desfavorável.

A longo prazo, espera-se que as inovações nos sistemas agroalimentares contribuam para assegurar o direito à alimentação, erradicar a pobreza, preservar a biodiversidade e ser resiliente às mudanças climáticas.

Fonte: Assessoria de Comunicação

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