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O Greening, pior doença da citricultura mundial, foi identificado pela primeira vez no Brasil em 2004, no município de Araraquara. Passados quase vinte anos, o problema continua desafiando citricultores e cientistas brasileiros.

Também chamada de huanglongbing (HLB) ou citrus greening, a doença prejudica gravemente as laranjeiras, causando queda prematura dos frutos e reduzindo sua qualidade. Sua transmissão se dá por meio de um inseto conhecido como “cigarrinha”. Estima-se que, hoje, quase 40% da produção nacional de laranja é afetada por esse vetor. A doença não tem cura e pode levar à morte das árvores afetadas.

Dados da Fundecitrus revelam que a incidência do Greening cresceu em 56% de 2022 para 2023, o que coloca em risco a liderança do Brasil no setor: os produtores brasileiros respondem por 34% da produção de laranja e 56% do suco da fruta produzido no mundo. Com 76% de participação no comércio mundial de suco de laranja, o País é hoje o maior exportador da bebida no planeta.

Com potencial para devastar pomares inteiros e derrubar a sua produtividade (na Flórida, estado americano que foi referência mundial em citricultura, a produção atual não chega a 70% do que era há 15 anos), o Greening exige respostas rápidas e contundentes dos cientistas e do poder público.

Segundo Alessandra Alves, pesquisadora do Centro de Citricultura Sylvio Moreira e especialista em Melhoramento e Genética Vegetal do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), um dos principais “gargalos” para o País avançar nas pesquisas e soluções de problemas enfrentados no setor da citricultura é a falta de pesquisadores e técnicos de apoio em número suficiente nos institutos de pesquisa.

Confira abaixo a entrevista concedida pela pesquisadora ao site da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC):

APqC – Algumas fontes afirmam que o Greening já afeta 38% das plantações de laranja no Brasil. Qual é o tamanho real do problema, especialmente no Estado de São Paulo?

Alves – Um dos grandes problemas dessa doença é a perda dos frutos, pois além da queda prematura os frutos ficam deformados e sem utilidade para suco ou consumo in natura. O problema pode ser agravado devido ao aumento da população de psilídeos (inseto transmissor da bactéria que causa o Greening), devido a resistência desses as moléculas dos inseticidas hoje disponíveis no mercado. Dessa forma, o risco aumenta, pois, com mais psilídeos, maior será a transmissão para plantas saudáveis.

A sensação geral é de que o Estado não tem respondido ao problema à altura. O que deveria ser feito para minimizar ou erradicar os efeitos negativos do Greening?

A meu ver, a questão do aumento do Greening não está relacionada a falta de apoio do Estado. Nos Estados Unidos por exemplo, onde foi investido mais de 10 milhões de dólares, a citricultura foi dizimada na Flórida devido a essa doença. No Brasil, graças a ações integradas para controle e estabelecimento de práticas agrícolas de manejo, seguimos com alta produtividade da cultura, apesar do Greening. O problema é que agora com a falta de moléculas efetivas para controle do inseto e para diminuir a população da bactéria e minimizar os danos causados nas plantas, precisamos rever as práticas adotadas e trazer inovações para dentro desse manejo e integrar tecnologias para continuar vencendo essa doença em São Paulo.

Como o IAC e demais Institutos de Pesquisa da Apta têm atuado nesse sentido?

O IAC, em parceria com outros institutos, tem trabalhado fortemente em várias frentes para combate ao Greening (ou HLB), que incluem ações de conscientização do setor para controle da doença, através de eventos e palestras (como a Semana da Citricultura), e desenvolvimento de pesquisas, como melhoramento genético para obtenção de variedades mais tolerantes a doença e aplicação de moléculas sustentáveis para manejo em plantas adultas. Atualmente temos em andamento o projeto Centro de Ciência para o Desenvolvimento apoiado pela FAPESP e iniciativa privada (CCD-CROP-IAC – https://www.iac-crop.org.br) que envolve o programa de melhoramento de porta-enxertos, e obtenção de plantas tolerantes por edição gênica.  Ainda temos uma patente do uso do N-acetilcisteina (NAC) na agricultura, que é uma molécula análoga ao aminoácido cisteína, encontrada naturalmente no alho, que já foi testada por três anos no campo em plantas adultas com HLB. Esperamos que em breve essa molécula seja aprovada como um defensivo natural, para combate a bateria e melhoria da planta, sendo mais um componente a ser integrado nas práticas de combate ao HLB e diminuição das perdas de produtividade.

O número de pesquisadores e pessoal de apoio hoje disponível é suficiente para fazer frente ao problema?

Definitivamente não. Esse pode ser considerado um dos principais gargalos para avançarmos nas pesquisas e soluções de problemas enfrentados no setor. Além disso é importante salientar a necessidade de aumentar nossos níveis salariais, uma vez que eles se encontram significativamente desfasados em relação aos de organizações similares, como os pesquisadores da Embrapa, por exemplo. A disparidade com nossos colegas tem causado desmotivação na equipe e representa um obstáculo para atrair novos talentos.

Bruno Ribeiro

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